Hoje tocou Paula Toller na TV e eu ainda odeio ela. Odeio ela e o tom de loiro do cabelo dela. Odeio ela e as desafinadas da voz dela. Odeio ela e o vibrato dela. Odeio o fato de ela ser espiritualizada e a maneira como ela fala como se fosse analisada. Odeio a calma com que ela canta de amor e separação. Odeio como ela parece ter vários amigos e como parece que ela não pensa em nada. Odeio a despretensão de “eu quero você como eu quero”. Odeio as músicas dela e até aquela que se salvava hoje me causa ódio. Ou é ódio ou é algo que eu não sei o nome. Só sei que não posso ouvir a voz dela, nem mesmo ler o nome dela na tela do celular. Odeio mais ainda porque ela me lembra você e talvez isso eu nunca supere. Talvez eu passasse por cima do sotaque dela, que eu odeio. Talvez eu conseguisse fechar os olhos e ouvir uma canção no rádio sem lembrar do rosto dela e daquela boca meio torta. Hoje não. Odeio sem ver, odeio sem ouvir, odeio só de pensar na Paula Toller. Não como um ódio gratuito de internet. Não, eu não sou um hater. Odeio porque ela me causa coisas que eu ainda não sei administrar, nunca aprendi, não tive o tempo suficiente pra aprender ou pra amar ela. Se esse ódio um dia vai passar? Não sei. Eu sei que por enquanto eu pulo qualquer música dela que surge na minha lista de músicas aleatórias, do mesmo jeito que eu pulo qualquer coisa que me lembre você.
14 dezembro 2018
12 dezembro 2018
Sinais
Caí feio. Devia ter percebido quando senti você colocar o braço em volta da minha cintura e me puxar pra perto de você, enquanto andávamos pelas ruas. Uma puta derrapada anunciada por trás das lentes dos seus óculos, nos seus olhos cansados. Estava tudo ali, na minha cara, um destino incerto, mas desenhado. Dei de cara na parede quando bebi um gole de gin tônica e peguei na tua mão. Meu rosto ficou dolorido e eu achei que era de tanto rir, mas foi da colisão. Fiquei tonto e fraco, mas minha inexperiência me enganou e segui convencido que isso era viver. Tropecei quando aceitei o que você me oferecia, quando me lambuzei nas suas palavras doces, quando baixei a guarda e deixei de andar atento à rua. Eu devia seguir o meu caminho como sempre segui, isolado, alienado, protegido por uma carcaça de insegurança. Só assim eu estaria seguro. Quebrei minhas duas pernas quando você me deixou no quarto, mas ignorei a dor e voltei para casa mancando, como se eu tivesse nascido daquele jeito. Algo estava errado e eu fingia para mim mesmo que era coisa da minha cabeça, que o risco é melhor que a calmaria, que eu teria quem me levantasse e me carregasse nas costas quando a dor fosse muito doída. Inocência. Agora eu me rastejo todo dia para fora da cama na sua direção, enquanto você me olha de volta com um sorriso enigmático no canto da boca. O sol se pondo atrás da sua cabeleira e eu desnorteado com o horário de verão.
10 dezembro 2018
Carne dura
Eu sinto a tua falta. Do teu hálito, do teu cheiro, do tom da tua voz. Eu escuto e escuto de novo os teus recados pra ver se eu me lembro como é estar do teu lado, mesmo que você esteja me afastando em cada um deles. Sinto falta das tuas tatuagens, dos teus anéis, do teu cabelo. Teu peito peludo, tua perna enroscada e da tua barba. Eu sinto falta dos teus beijos rápidos, dos demorados e da tua saliva na minha pele. Sinto falta da tua carne dura, do teu mamilo dormente e das tuas risadas. Sinto falta da sua piada, da tua conversa, do teu silêncio, do teu bom dia e do teu boa noite. Sinto falta da gin tônica, da rodela de limão e da tua mão na minha coxa, no meu peito. Sinto falta dos teus elogios, das tuas histórias, do teu olhar perdido, teu semblante cigano, aventureiro. Eu sinto falta de estar contigo, de verdade, isso me assusta.
Eu não sou do tipo de pessoa que se apega, do tipo de pessoa que sente falta. Ainda assim, eu sinto a sua falta. Isso não faz sentido. Parece uma brincadeira de mal gosto, mas eu sei que é só a vida sendo vivida. Parece tão injusto eu não poder mais falar contigo, não poder te tocar, não poder te ver. Eu sinto falta de ficar olhando você escondido. Contar os fios no seu rosto, beijar cada parte do teu corpo e de ficar do teu lado. Eu me pergunto pra onde tudo isso vai. O que eu faço com essa falta que ficou aqui? Eu sinto falta de você me explicar as coisas. De você me ajudar sem nem perceber que estava me ajudando. Eu sinto falta de poder sonhar, sem me achar ridículo. Eu sinto falta de ouvir você falar que ama falar de amor.
07 dezembro 2018
Carta II
Eu sei que não vai adiantar muito te perguntar nada porque esse tipo de sentimento que você deve estar sentindo a gente não controla. Eu já senti isso e sei que, por mais que a gente queira, a gente simplesmente não consegue escolher com quem a gente tem essa química, essa sintonia. A merda é que eu estava sentindo essa “química” e agora não estou conseguindo voltar atrás. E isso é algo que nunca me aconteceu. Tá sendo difícil pra mim parar de lembrar de você e de como eu me sentia com você. Apesar de a gente não ter combinado nada, ter ficado pouquíssimo tempo, eu me envolvi, mais rápido do que eu gostaria e, agora eu percebo, do que eu deveria. Talvez porque eu estava sensível, talvez porque você é um cara do jeito que eu sempre quis conhecer ou porque eu estava desesperado. Não sei. Eu só queria que você fosse mais claro comigo. Que você me dissesse porque essa chave mudou assim, do nada. Eu já pensei e repensei varias vezes e eu não acho que os poucos momentos que a gente passou não tenham sido reais. Talvez eu tenha fantasiado um pouco. Talvez isso tenha te assustado. Mas você estava a fim de mim, né? Eu não estava nessa sozinho, estava? Quando tudo mudou? Desculpa procurar uma explicação, desculpa principalmente te encher o saco com esse textão. Mas está muito difícil. Pensei que eu passaria por isso com mais facilidade, que eu ia entrar num app e esquecer você. E aí com quem que eu dou de cara no app? Com você. Aí tudo ficou mais confuso ainda. Porque eu não estou te cobrando, nem nada. De verdade. Ainda que soe como uma cobrança. Mas a minha cabeça ficou ainda mais confusa quando eu vi você lá. Porque eu tinha certeza de que você estava mal, que você queria ficar isolado. E entrar no app não parecia ter nada a ver com isso. Claro que você tem todo o direito de fazer o que você quiser. Sempre teve. Inclusive enquanto vc estava me conhecendo. Mas eu fiquei confuso. Pensando bem, talvez eu tenha ficado confuso justamente pra não ter que ver a realidade. Talvez você estivesse procurando alguém pra ajudar você a sair dessa bad, o que provavelmente eu não estava fazendo. Eu só queria saber se é isso. Ou se você encontrou alguém novo e com quem você teve uma coisa maior. Ou se você reencontrou alguém antigo que abalou você e fez você ver que eu e você não somos algo com futuro. Ou se tem algo a ver com meu corpo, meu sexo. Sei lá. Queria que você me ajudasse a parar de me perguntar o que deu de errado. Como a gente passou aquela quarta-feira tão legal e, do nada no domingo, você não estava mais com interesse. Eu cheguei até a pensar que você ficou chateado comigo porque eu não fui ver tua peça. Sei lá. Pensei em um monte de coisas. Nada parecia fazer muito sentido. É uma merda tentar adivinhar o que se passa na mente dos outros quando a gente não sabe nem o que se passa nossa, muitas vezes. Eu sei que não vai mudar nada pra você. Sei que, se você decidiu se afastar, foi porque você teve seus motivos e nisso pode colocar aí crise existencial ou simplesmente que você deixou de ter interesse em mim. Mas me ajuda a entender por que, se eu não estiver abusando. E você pode ser sincero. De verdade. Pode falar a verdade, mesmo que não seja gentil. Talvez se você não for gentil, eu posso ficar com raiva de você e tudo passa mais rápido. A essa altura do campeonato, você já deve estar com raiva de mim por causa desse melodrama todo. Eu aqui, sendo justamente o contrário do que eu disse que seria. Eu sei que eu disse que eu cairia fora assim que você desse pra trás. Mas, cara, eu quebrei a cara. Estou reconhecendo isso. Gostei de ficar contigo mais do que eu achei que estava gostando.
Desculpa mais uma vez por simplesmente não deixar o barco rolar, a fila andar e estar te perturbando. Só que eu não conseguiria passar mais um dia nessa neura.
😘
05 dezembro 2018
Atores
Atores atuam até quando não estão atuando. É involuntário. O sistema nervoso se liga ao sistema digestivo mandando pulsações neurointestinais de segunda ordem que fazem a fala sair com naturalidade. Ainda que não seja nada daquilo que o coração quer falar. Os gestos vêm espontaneamente, realismo de Stanislavski saindo pelos poros e umedecendo os pelos do corpo todo. Desse jeito fingem calor. Fingem tesão gemendo baixinho, tremendo o terço central dos corpos preparados nas aulas de preparo. Se contorcem, gritam, fazem o inferno. Tudo isso porque é o que seus corpos, da maneira mais fisiológica possível, ordena. E, quando olham com olhos semicerrados nos seus olhos e dizem que estão felizes ao seu lado, eles realmente acreditam naquilo. Até que deixam de acreditar. Quando a cortina cai eles de repente se sentem nus e percebem as técnicas que usam sem nem notar. As falas escritas por outros não saem mais com a verdade que saíam, um constrangimento cor de rosa toma conta do palco e tudo o que eles querem é fugir. Vomitar na coxia, meditar no camarim ou dar um trago em um copo de uísque para emular os grandes clássicos em preto-e-branco. Atores produzem dramas até quando não precisam. Pelo simples prazer de viver um drama real. Podem ser românticos ou cômicos, mas o que gostam mesmo é de uma tragédia. E tudo isso vem sem querer mesmo. Como vem uma vontade de fazer xixi. Eles acordam, colocam as roupas do personagem, saem por aí recitando frases de efeito e quando veem têm a plateia nas mãos. Aí ficam aterrorizados, com a sensação de que fora pouco tempo de ensaio. Fazem o que podem com emoções que têm em suas mãos e terminam a temporada. Engatam em um novo projeto antes mesmo de saírem do anterior. De segunda a quarta, se preparam. De quinta a domingo, se apresentam às nove no teatro do centro. Domingo tem duas sessões. Uma às cinco, outra às sete. Sucesso de bilheteria.
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