Você me olha desconfiado, se esgueira pela casa sempre que
eu chego. Se eu entro em um cômodo você corre para o outro. Às vezes eu nem te
vejo. Outras vejo só sua sombra rápida, atlética, noturna. Eu vivo a minha vida
sendo observada por você, eu tenho certeza. Mesmo que você não tolere a minha
presença, mesmo que você sempre se afaste, eu sei que em algum lugar você está
me olhando. Eu posso sentir seus olhos desconfiados. E eu respeito a sua
decisão de não se render a mim e ao meu amor. Enquanto isso sigo enchendo você
de comida, de água, de leite e espalho brinquedos de plástico pela casa. Enquanto
eu transito de um lado a outro, eles continuam por lá, exatamente onde sempre
estiveram. Então eu vou dormir e quando acordo a luz do novo dia já mostra a
casa redesenhada. Você deixou a sua marca, mudou tudo de lugar, mesmo que
delicadamente. É só o que eu preciso para saber que você ainda está aqui. Que você
ainda não desistiu da gente, só está escondido atrás de uma almofada ou de um
vaso de planta. Eu me arrumo pra sair pro trabalho sentindo os seus olhos me
seguindo. Em algum lugar eu sei que você está, mas já passamos por isso tantas
vezes, sei que não vale a pena te procurar. É seu jeitão de me amar, assim
distante, invisível. Afinal, se você não me amasse, já teria pulado pela janela
da cozinha. Ninguém fica tanto tempo apenas por comida.
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