19 fevereiro 2010

Arlequim

Ele era médico geriatra, cuidava dos velhos e de seus problemas de velhice. Sabia tudo sobre fraldas geriátricas e sobre todas as outras palavras que acompanham a palavra geriátrica. Media um metro e oitenta e cinco e pesava uns noventa e cinco quilos. Ou eu digo isso só pra ele parecer mais gordo que eu. Talvez ele fosse mais gordo que eu, talvez seja só liberdade poética.

Era sábado de carnaval. E o melhor baile seria só na terça-feira mesmo. A terça-feira é o dia do “agora-tem-que-ir”. Ainda havia muito tempo para aquela sensação surgir. Meu joelho estava inteiro, meu cotovelo também. Meu telefone celular também, ao contrário de muitos outros. Afinal de contas, já era sábado de carnaval na cidade onde o carnaval começa no Réveillon.

Meu telefone inteiro tocou, aquele que fica guardado em cima das cuecas que estão usadas e não foram recolhidas pela minha mãe. Atendi o médico como que atende um cliente, mas é ele quem cuida da saúde dos outros. É ele quem ganha com isso, alguém um dia me disse.

O caminho seria o frio, pra fugir do inferno que a cidade estava. Pra comer também, por que não? A gente adora comer. Mesmo que seja carnaval, mesmo que eu tenha dito milhões de vezes que estou de dieta. Sempre tem um espaço pra um rodízio de pizza ou pra umas temakis de salmão simples.

Salmão faz bem pra saúde, tem ômega de algum número que não me lembro, mas que o médico insistia em citar nos nossos papos descontraídos sobre Alzheimer. Salmão faz bem pra memória e leite bem pros ossos. Mesmo que você só tenha 20 anos de idade.

Os ossos são sempre muito usados. Ainda mais no carnaval, né? Ainda mais em Visconde de Mauá...

Usei meus ossos até umas onze da noite, depois disso ia dormir no meu quarto. Meu? Médicos sempre deixam você no seu quarto, não é assim? Médicos sempre cuidam da sua saúde. A prioridade é manter seu corpo são e sua mente sã. Minha mente não está sã há muito tempo. E bota tempo nisso.

Meus ossos expostos no bloco de domingo, de volta ao Rio. Fui de chapéu de palha, eu e a Amália. Não fui de roupa branca por questões pessoais. Não me lembram coisas boas e a catequese está dentro dessas coisas, sim.




A segunda-feira de carnaval me fez ver que o carnaval havia terminado para mim desde a quinta do bendito queijo-ralado. Voltei pra casa decidido a perder o baile de terça-feira, o melhor de todos. Minha fantasia de marinheiro parada no cabide, do lado do Peter Pan que não cabe mais em mim. Minhas calças também não cabem mais em mim.

Mesmo a palavra mágica Absolut de maracujá não foi suficiente pra me arrastar pelos corredores do Humaitá. Deve ter sido alguma medicação que aquele médico me dera. Maldito médico que trata da minha velhice e me torna mais velho. Ou talvez tenham sido os ares de Visconde de Mauá ou de Vancouver.



*Ouvindo: Copacabana – Marcelo Camelo

4 comentários:

  1. Todo carnaval tem seu fim...só fica a lembrança e (sinceramente!) a vontade q o próximo chegue logo

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  2. Pois é.
    Acabou-se o carnaval e o pierrot chora, sem sua colombina.

    Teu comentário lá no blog bateu forte.

    Abraço. A gente se vê.

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  3. Ai, como eu queria um médico na minha vida... desses que querem que minha saúde melhore e que cuide de mim! ahhahaah

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  4. é melhor sempre culpar o médico. ele vive da nossa miséria! =)

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